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Prof. Dárcio Guimarães de Andrade*
O tema é sempre objeto de debates, pois as cooperativas são uma realidade em todo o mundo, despertando sentimentos de amor e de ódio. Com dois artigos já escritos a respeito da matéria, volto a falar sobre cooperativas de trabalho e da sua relação com os cooperados e tomadores de serviço.
O Decreto 22.239/32, já revogado, conceituava a cooperativa como aquela constituída entre operários de uma determinada profissão ou ofício ou de ofícios vários de uma mesma classe, com a finalidade primordial de melhorar salários e as condições de trabalho pessoal de seus associados e, dispensando a intervenção de um patrão ou empresário, se propõem a contratar e executar obras, tarefas, trabalhos ou serviços públicos ou particulares, coletivamente por todos ou por grupos de alguns.
A conceituação foi substituída na Lei 5.764/71, que hoje rege as cooperativas: sociedade cooperativa é modalidade de sociedade de pessoas com forma e natureza jurídica próprias, não sujeitas à falência, e de natureza civil. No seu art. 3o., dispõe: "celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro". O lucro é, essencialmente, o que difere a cooperativa das demais sociedades.
A origem das cooperativas de trabalho remonta ao Século XIX, como forma de reação dos trabalhadores à revolução industrial. Surgiu na Inglaterra. No Brasil, a Constituição Federal de 1988, no seu art. 174, parágrafo 2o., estabelece o apoio e estímulo ao cooperativismo.
Praticamente todos os países do mundo possuem cooperativas, consideradas de grande importância na economia. Tanto que a OIT, pela Recomendação 127/66, destacou: "com a finalidade de melhorar as oportunidades de emprego, as condições de trabalho e as receitas dos trabalhadores agrícolas sem terras, deveriam estes ser ajudados, quando for conveniente, a organizarem-se, voluntariamente, em cooperativas de trabalho".
O ART. 442, DA CLT.
As constantes evoluções acerca do direito trabalhista levaram a uma nova redação do art. 442, da CLT, ditada pela Lei 8949/94, ficando preceituado em seu parágrafo único que, qualquer que seja o ramo de atividade da cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviço.
Ora, a proibição do vínculo entre cooperativa e associado já existia na redação do artigo 90, da Lei 5.764/71. A novidade veio no afastamento do vínculo de emprego do associado com o tomador de serviços da cooperativa. O objetivo do legislador foi, claramente, o de viabilizar a terceirização e é resultado de uma tendência moderna para flexibilização da legislação trabalhista. A hipótese é aquela expressa no item III, "in fine", do Enunciado 331/TST, ou seja, não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
O projeto da Lei 8949/94 foi de autoria de Deputado petista e nasceu a partir de um pedido formulado pelo Movimento dos Sem Terra do Mato Grosso. O escopo maior foi o de acabar com o terrível mal do desemprego. Adite-se que o sonho de todo empregado é de se transformar em empresário, e a lei das cooperativas assim o permite. Todos os cooperados são donos do empreendimento.
O parágrafo único do art. 442/CLT é eficaz juridicamente e deve ser aplaudido, pois representa um progresso. Mas há de se deixar claro que o dispositivo se dirige, apenas, às verdadeiras sociedades cooperativas, àquelas cujo objeto social atende ao disposto na Lei 5.764/71, conhecida popularmente como Lei do Cooperativismo. Podemos enquadrar nesse grupo as cooperativas de trabalho médico, cooperativas de crédito, de produtores rurais e outras. Caso contrário, o que se terá é a figura do "gato", o aliciamento de trabalhadores braçais, onde se espelha, tão-somente, a vontade dos patrões e nunca a livre decisão desses trabalhadores.
Os benefícios da cooperativa, para o trabalhador, são muitos. A verdadeira cooperativa ajuda o "bóia fria", pois uma cooperativa agropecuária organiza o trabalho no meio rural, acabando com jornadas excessivas e garantindo maior sucesso na comercialização do produto, tendo como resultado uma melhor remuneração do trabalhador.
Pela lei, assegura-se à sociedade e aos tomadores de serviço a ausência de qualquer responsabilidade perante o trabalhador. O pagamento é combinado e recebido pela própria cooperativa, que reparte o rendimento entre os sócios. Os resultados retornam aos associados de forma proporcional às operações realizadas.
A cooperativa não pode ser considerada como um atentado aos direitos dos trabalhadores. O seu objetivo é a redução de custos mediante aprimoramento da produção, trazendo melhores condições de vida.
Também não há que se falar que as cooperativas retiram direitos dos trabalhadores. Isso porque a cooperativa se sujeita a regime legal próprio, diverso da CLT. As condições de trabalho são fixadas pelos próprios trabalhadores, que são donos, e os direitos podem ser maiores do que aqueles assegurados pela CLT. Tudo irá depender do sucesso da cooperativa regularmente constituída.
A COOPERATIVA - SUA CRIAÇÃO E FUNCIONAMENTO.
A criação de uma cooperativa segue os requisitos da lei civil. O primeiro passo é organizar um grupo mínimo de 20 pessoas, conforme disposto na Lei 5764/71. É realizada assembléia e elaborado o estatuto da cooperativa. Nos termos do artigo 5o., inciso XVIII, da Constituição Federal, a criação de cooperativas independe de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento. A despeito da norma constitucional, deve ser feito o registro na Junta Comercial. Somente a partir desse registro é que a cooperativa adquirirá personalidade jurídica e estará apta a funcionar. É interessante, ainda, o registro na Organização das Cooperativas de cada Estado - OCE - que é o órgão representativo do Movimento Cooperativista.
Para administrar a cooperativa os associados elegem uma diretoria e um conselho fiscal e somente através de uma efetiva participação de todos os sócios se poderá obter sucesso no empreendimento.
As cooperativas têm uma responsabilidade para a comunidade, pois são criadas para servir. Devem fornecer serviço confiável e de boa qualidade. No estatuto, deve estar prevista a forma de participação do associado. As cooperativas não visam lucro. Logo, esse sistema elimina a intermediação entre o associado e o tomador. Os preços são mais justos. O principal é o "homem" e não o "capital".
O funcionamento de cada cooperativa depende da atividade econômica a que se destina. Numa cooperativa agropecuária, por exemplo, os produtores rurais se associam para a execução das etapas que envolvem a agricultura ou a pecuária, como a compra de sementes, o beneficiamento, o armazenamento da safra e, finalmente, a venda. Numa cooperativa de crédito são oferecidos aos associados empréstimos com juros mais baixos dos que os cobrados pela rede bancária. No setor de saúde, um dos segmentos cooperativistas que mais tem crescido no país nos últimos anos, ocorre a reunião de médicos, dentistas, enfermeiras e outros profissionais do setor, visando o atendimento público de saúde, de boa qualidade, em melhores condições de trabalho e remuneração geralmente melhor do que a percebida pelos associados quando assalariados da rede pública de saúde.
DIREITOS E DEVERES DO ASSOCIADO
O associado, desde que ingressa na cooperativa, passa a ter direitos e deveres que devem ser respeitados. Dentre eles destaco os seguintes deveres:
respeitar as decisões votadas nas Assembléias Gerais, por representarem a vontade da maioria;
fazer o pagamento da cota de capital fixada para criar ou ingressar na cooperativa;
zelar pelo interesse comum;
zelar pela autonomia da sociedade;
colaborar no planejamento, funcionamento, avaliação e fiscalização das atividades desenvolvidas pela cooperativa;
debater idéias e decidir acerca dos objetivos e metas de interesse da cooperativa;
denunciar os procedimentos indevidos porventura havidos;
pagar sua parte, caso ocorram prejuízos financeiros;
estimular a integração da cooperativa com o movimento cooperativista;
buscar capacitação profissional para o desempenho de suas atividades.
São direitos dos associados:
freqüentar as Assembléias Gerais, decidindo pelo voto os assuntos de interesse da sociedade;
votar e ser votado para cargos administrativos, fiscais ou outras funções;
participar das atividades econômicas, sociais e educativas;
ser consumidor e usuário dos serviços oferecidos pela cooperativa;
receber retorno proporcional das sobras de capital;
examinar os livros e documentos da empresa e solicitar esclarecimentos aos dirigentes, conselheiros e funcionários;
convocar Assembléia Extraordinária, caso se faça necessário, conforme estabelecido no estatuto;
obter, antes da realização da Assembléia Geral, balanços financeiros, demonstrativos e relatórios;
retirar seu capital ao sair da sociedade, de acordo com o estabelecido no estatuto.
COOPERATIVAS DE TRABALHO
Problema sério que surge é o das cooperativas de trabalho, um segmento em expansão, em resposta à crise do desemprego, onde seus associados prestam serviços a terceiro.
O art. 20 da Lei do Cooperativismo declara livre o ingresso nas cooperativas "a todos que desejarem utilizar os serviços prestados pela sociedade". A previsão legal, portanto, é apenas no sentido de que a cooperativa seria criada para prestar serviços de interesse dos associados. Nada se falava acerca de serviços prestados por estes a terceiros mediante intermediação da cooperativa.
Veio, então, a regra do parágrafo único, do art. 442, da CLT, autorizando as cooperativas de trabalho e afastando a tutela celetista, o que gerou o inconformismo de líderes trabalhistas, juízes e renomados autores e levou ao aparecimento de falsas cooperativas, acobertadas pelo manto da lei.
PREVIDÊNCIA SOCIAL
O encargo previdenciário de responsabilidade das cooperativas de trabalho é pesado.
É considerado autônomo o trabalhador associado à cooperativa que, nesta qualidade, presta serviços a terceiro, como disposto no Regulamento de Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Dec. 2.173, de 05/03/97. É, portanto, segurado obrigatório da Previdência Social e, como contribuinte, terá assegurado todos os benefícios da Previdência Social. Pelo art. 21, da Lei 8.212/91, a alíquota de contribuição do trabalhador autônomo é de 20%, incidente sobre o respectivo salário de contribuição.
Quanto a essa contribuição, sempre preconizei que a cooperativa, para maior garantia, deveria ficar com os carnês e providenciar, mensalmente, o recolhimento, diante do desinteresse do cooperado. Seria mais lógico.
Mas não é só.
A Lei Complementar 84, de 18/01/96, ainda estabelece uma contribuição a cargo das empresas cooperativas, no valor de 15% do total das remunerações ou retribuições por elas pagas, em razão da prestação de serviços pelos trabalhadores autônomos.
- Seria bitributação?
- É ônus excessivo para as cooperativas, capaz de inviabilizar o seu funcionamento?
As respostas, infelizmente, são afirmativas, cabendo ao legislador solucionar o grave problema que se apresenta como entrave ao desenvolvimento das cooperativas.
AS FALSAS COOPERATIVAS
Infelizmente, estamos vendo proliferar entidades cooperativas de trabalho apenas no nome e que, na prática, funcionam como meras prestadoras de serviço não especializado, a terceiros, mormente quando a mão-de-obra é desqualificada e ignorante. Há, nesse caso, exploração de trabalho alheio e não conjugação de esforços para a consecução de um objetivo comum. O que ocorre, via de conseqüência, é a sonegação de direitos trabalhistas constitucionalmente garantidos, com ausência de carteira de trabalho assinada, o que caracteriza fraude à legislação.
Não se deve, contudo, prejulgar que toda cooperativa de trabalho é fraudulenta, pois isso significaria em abolir de vez tal espécie de cooperativa. E não se pode negar que a cooperativa trouxe possibilidade de subsistência a inúmeras áreas carentes e se tornou vantajosa para os trabalhadores, que a controlam e são os verdadeiros "donos" do negócio. Mas a fraude afasta sua aplicação. As falsas cooperativas não têm autorização para funcionarem e trazem prejuízos aos trabalhadores, que não recebem seus direitos.
Quando a lei exclui os cooperados da CLT, ela se refere apenas àqueles que, realmente, são associados. Trata-se de uma presunção relativa de inexistência de vínculo.
Pouco importa a denominação de cooperativa. O indispensável é que a relação jurídica se desenvolva nos moldes da lei. Mas por trás da figura do cooperado pode esconder-se uma autêntica relação de emprego, em flagrante atentado à legislação, o que encontra obstáculo no art. 9o., da CLT, que estatui: "são nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na Consolidação".
Segundo Gabriel Saad, um critério capaz de identificar o verdadeiro associado de uma cooperativa de serviços é o fato de que, ordinariamente, ele é incumbido de realizar, na empresa contratante, trabalho de curta duração e cuja especificidade exige conhecimentos especializados.
Fato relevante para se constatar a fraude é quando a cooperativa se apresenta como sucessora de empresa que fora a empregadora inicial do reclamante.
Considero, ainda, fraude, o hospital dispensar todos os médicos e recomendá-los a criar cooperativa para prestar similares serviços ao hospital, nos mesmos horários. Certamente, nenhum Juiz dará guarida a tal cooperativa. Idem se o fazendeiro despedir todos os empregados e obrigá-los a fundar cooperativa de trabalho, no escopo de trabalhar nos mesmos horários, funções e fazenda.
Não basta verificar, apenas, se os serviços prestados pelos cooperados estão inseridos na atividade-fim da empresa, de modo a considerar a situação como fraudulenta. Há casos em que o trabalho na atividade-fim não se constitui fraude, como se verifica na cooperativa de médicos prestando serviços em hospitais, como, por exemplo, a UNIMED, para quem o médico fornece algumas horas de sua agenda e recebe serviços de apoio, como laboratórios, equiparamentos radiológicos, etc, aos quais não teria acesso sem a cooperativa.
Para a caracterização da verdadeira cooperativa de trabalho é importante observar:
se a cooperativa, além de oferecer trabalho ao associado, oferece também serviços, como saúde, aquisição de equipamentos e alimentos a baixo custo, etc.;
se a cooperativa oferece aos seus associados oportunidade de auferir ganho superior àquele que teria se ofertasse a sua força de trabalho de forma isolada;
se estão ausentes a subordinação, pessoalidade e eventualidade. Observar se o obreiro está sujeito a horário, regulamentos de empresa, se já foi advertido, se o serviço pode ser prestado por qualquer cooperado, se a atividade desempenhada está relacionado com a atividade principal da tomadora, etc.;
se foi fixado valor razoável às cotas-partes, pois, caso contrário, ficaria impossibilitada a necessária assistência aos cooperados.
Inúmeras demandas trabalhistas ensejaram o fechamento de cooperativas, porquanto eivadas de fraudes. A Justiça, em cada caso concreto, apurará se houve subordinação do associado à tomadora dos serviços e, se tal ocorrer, com arrimo no artigo 9o., da CLT, decidirá a respeito do vínculo direto entre eles.
Muitas são as cooperativas legais e sadias, que permitem a inserção no mercado de trabalho de um grande contingente de pessoas, antes desempregadas, proporcionando-lhes trabalho melhor e melhor renda, transformando-as em empresários. Mas vislumbra-se, de um outro lado, cooperativas fraudulentas que objetivam, unicamente, a exploração de mão-de-obra, totalmente alheias ao sistema cooperativista legalmente previsto. Para esses casos existe o art. 9o., da CLT.
Recentemente, o Ministério Público do Trabalho apurou que estão sendo criadas, em Minas Gerais, entidades cooperativas de trabalho atuando, sobretudo, nas regiões de cultura de café e cana-de-açúcar, sem oferecer a mínima condição de trabalho aos indivíduos que conglomera, ignorando normas regulamentares de saúde e segurança de trabalhadores, sendo que algumas chegam a ter mais de 10 mil trabalhadores como associados. Foi proposta ação civil pública perante a Justiça do Trabalho da Terceira Região, visando a declaração de "inidoneidade" das cooperativas, sendo que, no julgamento do TRT/PI/05/97, ficou decidido, embora com divergências, que as cooperativas sujeitam-se à jurisdição da justiça comum, única competente para examinar e declarar a regularidade, ou não, de sua constituição e retirar-lhe a possibilidade de atuar no mercado, se comprovado o desvio ou fraude de finalidade.
Há de se combater os abusos. As falsas cooperativas devem ser denunciadas ao Ministério Público do Trabalho, à Delegacia Regional do Trabalho e, até mesmo, à Organização das Cooperativas, que, como órgão representativo do Movimento Cooperativista, poderá tomar as providências cabíveis perante os órgãos competentes para que o fraude seja exterminada.
Há de salientar-se que a criação e manutenção de cooperativas de trabalho fraudulentas importam na responsabilização criminal dos responsáveis, pois tal prática constitui crime previsto no artigo 203, do Código Penal.
JURISPRUDÊNCIA
A Justiça do Trabalho tem sido enérgica no tocante à existência de fraudes, mas reconhece a validade das cooperativas regularmente constituídas. Veja-se a jurisprudência do TRT da Terceira Região:
COOPERATIVA.SUBORDINAÇÃO JURÍDICA. INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. As intervenções de Cooperativa nos trabalhos de seus associados, no sentido de oferecer monitoramento e aperfeiçoamento dos artesanatos não podem ser tomadas como estabelecimento de regras para a execução dos serviços, mas antes esforço comum para o aprimoramento da qualidade dos mesmos, no interesse dos próprios associados. Não constatada fraude na associação entre as reclamantes e a cooperativa reclamada, não se reconhece vínculo empregatício entre as mesmas. (TRT/RO/2044/96, Rel. Juiz Vieira de Melo Filho, publ. MG 03/08/96).
COOPERATIVA - VÍNCULO EMPREGATÍCIO - LIMITES - A introdução do parágrafo único do art. 442, da CLT, através da Lei 8949/94, não produz modificação significativa na esfera do Direito do Trabalho, porquanto a política nacional do cooperativismo é objeto da legislação complementar desde a edição da Lei 5764/71. O realce concedido refere-se à finalidade social para uma política de formas alternativas de colocação de mão-de-obra. Todavia, se da relação jurídica emergir uma realidade fática não coincidente com as finalidades do cooperativismo, que visa o bem comum e, portanto, a distribuição isonômica dos ganhos auferidos por todos, bem como dela resultar evidenciado nitidamente os pressupostos do artigo 3o. consolidado, impõe-se o reconhecimento do vínculo de emprego, com todos os seus consectários legais, ante a regra inafastável do artigo 8o., do mesmo diploma legal. (Ac. TRT/RO/19341/96, Rel. Juiz Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, publ. MG 21/06/97)
COOPERATIVA E FRAUDE AO CONTRATO DE TRABALHO - Se a cooperativa tem evidentes fins lucrativos e não presta, efetivamente, nenhum serviço diferenciado aos seus associados ou cooperados, descaracterizados estão os artigos 3o. e 4o, item X, e demais disposições da Lei 5764, de 16 de dezembro de 1971, pelo que o contrato de atividade do recorrente com o recorrido é aquele preconizado nos artigos 442, "caput", 2o. e 3o., da CLT. Pela incidência dos artigos 9o., e 444, da CLT, além do artigo 1o., parágrafo 2o., da Instrução Normativa de no. 09/91 e também do Enunciado 331, "caput", do TST, o vínculo deve ser formado diretamente com o tomador de serviços. (Ac. TRT/RO/3069/97, Rel. Juiz Celso Honório Ferreira, publ. MG 20/02/98).
COOPERATIVA DE TRABALHO - VÍNCULO DE EMPREGO - INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA - FRAUDE - Ao excluir da CLT os cooperados, o parágrafo único do artigo 442 celetista refere-se apenas àqueles que realmente são cooperados, mantendo entre si relação societária. Em outras palavras: pessoas que não se vinculam ao tomador de serviços, nem à própria cooperativa, pelos laços da pessoalidade, subordinação, não eventualidade e salário. Presentes, na relação de trabalho, os elementos configuradores do vínculo de emprego (art. 3o., da CLT) e a inexistência de uma melhor retribuição aos associados pelos trabalhos efetuados, na condição de cooperados, resta caracterizada a fraude, pela qual a cooperativa, funcionando como uma verdadeira "agência de serviços", intermediadora de mão-de-obra, arregimenta mão-de-obra para terceiros (tomadores de serviços), esquivando-se das obrigações trabalhistas, fraudando, assim, as garantias laborais previstas na lei e na Constituição. (Ac. TRT/RO/15544/97, Rel. Juiz Luiz Ronan Neves Koury, publ. MG 04/04/98).
CONCLUSÃO
Tenho abordado, como Juiz, Professor e cidadão, o sedutor tema, sem qualquer ódio ou preconceito. Nunca poderei julgar por aparência, pena de cometer lastimável injustiça, enchendo o meu espírito de dúvidas e tristezas. A existência da cooperativa é manifestamente legal, escorada em sadios princípios, mormente o de combater o nefando desemprego, mal que assola todo orbe. Ela permite, às escâncaras, a inserção no mercado de trabalho dos desempregados, vítimas da crise hodierna. No meio rural, acaba com o gato e resolve o problema dos bóia-frias. Em havendo fraudes, a Justiça, com supedâneo no art. 9o., do Estatuto Celetizado, declara-la-á. Felizmente, o número de pseudocooperativas é ínfimo, trazendo para o mercado formal os desempregados e melhorando a renda de seus associados, como tenho visto no interior, mormente em São Gotardo. Os associados se tornam empresários, realizando doces sonhos, transformando-se em autogestionários de suas atividades. O lucro, obviamente, ficará com a cooperativa, revertendo-se em prol dos associados. A cooperativa tem salutar fito e o trabalho é executado com dignidade, gerando, destarte, melhores condições de vida para os associados, bem melhores do que se fossem empregados.
Existem, no Brasil, mais de 7.000 cooperativas, gerando 42 bilhões de reais de receita, participando com 6% do PIB brasileiro. Cerca de vinte milhões de brasileiros estão nelas envolvidos, gerando riquezas para si e para nosso torrão natal.
As cooperativas são utilizadas, no mundo, como solução para o desemprego ou sua atenuação. A Recomendação 127/66, da OIT, destacou o papel relevante das cooperativas, como elemento fundamental no desenvolvimento econômico, social, cultural e político dos países, colaborando para o bem estar do povo. Nossa Carta Política, como explicitado no parágrafo 2o., do art. 174, determina o estímulo ao cooperativismo. O assunto é tão importante que veio para o bojo da CF/88 e o constituinte soube bem o que fez. Em 1932, via Decreto 22.239, constou-se que a cooperativa melhora as condições de trabalho pessoal de seus associados, dispensando a intervenção de patrão. Hoje, a Lei 5764/71 regulamenta, taxativamente, a vida das cooperativas. Tem, pois, o cooperativismo, apoio na OIT, na Constituição Federal e Lei Ordinária, dando-lhe reconhecimento interno e externo.
Não acredito, nem de leve, que um deputado petista pudesse apresentar projeto de lei lesivo aos trabalhadores, passando incólume por todas as Comissões e pela sanção do Presidente, advindo o parágrafo único, do art. 442/CLT, com o claro objetivo de combater o desemprego.
Elas não retiram direitos trabalhistas, pois os associados ganham mais e contribuem, como autônomos, para a Previdência Social, gozando do seu pálio. Sempre preleciono, sem medo de errar, que o sistema de cooperativa difere da CLT, não se justificando, em sã consciência, as descabidas comparações. Ademais, ao se firmar contrato da cooperativa com o tomador de serviços, todos os custos estarão embutidos no preço.
A cooperativa, conforme curial sabença, tem como escopo a relação de trabalho e jamais a de emprego. O associado melhorará o seu status, advindo melhores condições, como vi nos vários lugares onde profiro palestras. Na cooperativa, os direitos são estatutários, aprovados pela Assembléia, resguardando-se a predominância do trabalho sobre o capital.
Os princípios cooperativistas, em sendo acatados, geram mais vantagens para os associados, que se transformam em patrões de si mesmo e, logicamente, com melhores condições de vida. Ademais, os encargos para o tomador de serviços são reduzidos de 102% para 40%, o que é plenamente válido no regime capitalista, onde o lucro não é imoral. O tomador tem mesmo que zelar pelo seu patrimônio.
As cooperativas são úteis e merecem maior divulgação, afastando a intromissão indevida de fiscais.
O Ceará, hoje, é modelo de cooperativismo sadio e vitorioso. Várias empresas do Sul lá se instalaram, via cooperativas, objetivando redução de custos. Elas geram trabalho para os associados, combatendo o terrível desemprego.
Relembro que o tomador de serviços não pode pagar, nem dar ordens diretas aos associados, pena de o vínculo empregatício com ele se formar, diante da subordinação e onerosidade.
Recomendo, como brasileiro, sua difusão. E o faço com a consciência tranqüila, convicto de que estou, como cidadão, dando minha colaboração para extirpar o desemprego. Não existe melhor meio do que as cooperativas de trabalho, bem estruturadas. Até os lixeiros de Goiânia, em gesto digno de imitação, criaram cooperativa de trabalho, aumentando sua receita. Em Minas Gerais, como foi divulgado pela mídia, algumas empresas falidas, sem crédito, voltaram a gerar empregos via cooperativas formadas pelos próprios empregados.
Não se pode, como prelecionado, intitular, a torto e a direito, todas as cooperativas de fraudulentas. Elas têm apoio em farta legislação de total eficácia que, enquanto não revogada, deve prevalecer.
Não se pode, ainda, exigir conduta ilibada do desempregado, pois a fome é implacável.
Vejo, pois, como solução legal, à qual se deve dar maior divulgação, a criação de mais e mais cooperativas de trabalho entre nós.
Finalmente, a elas não se aplica o princípio da unicidade, o que permite a criação de várias cooperativas dentro do Município. O grande inimigo está no INSS, ao cobrar os terríveis 15%, conforme lei mencionada.
O mundo é dos ousados e atrevidos.
Devem ser criadas as cooperativas, sem medo.
Belo Horizonte, 03 de dezembro de 1998.
* Juiz Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região