15.2.09

CRITÉRIOS PARA A IDENTIFICAÇÃO DA COOPERATIVA DE TRABALHO

ARTIGO ORIGINAL

1. INTRODUÇÃO

A ORGANIZAÇÃO DAS COOPERATIVAS BRASILEIRAS - OCB, vêm por meio do presente documento exteriorizar seu posicionamento no que tange a identificação (natureza jurídica) de uma cooperativa de trabalho.

Este fato decorre não só da necessidade interna, do sistema cooperativo, mas também da própria sociedade que clama pela identificação de uma cooperativa de trabalho. As mesmas, pela falta de conceituação específica, vêm enfrentando sérios embates com o poder constituído. No campo do direito, por exemplo, não são raras as divergências nas interpretações. O poder judiciário, em particular a Justiça do Trabalho, nesse sentido, tem se posicionado. São inúmeras as decisões da justiça que identifica a natureza jurídica das cooperativas de trabalho sob várias formas antinômicas, o que não é salutar. No mesmo sentido, e da mesma forma, vem se manifestando os fiscais do trabalho, membros de Ministério Público do Trabalho, do Tribunal de Contas da União etc.

É de reconhecimento público que as cooperativas de trabalho, enquanto fato social, se multiplicaram no seio da sociedade brasileira. No entanto, essa condição não foi suficiente para permitir que a sua existência e contratação estivessem consolidadas, mais ainda, pacificadas.

Atualmente, os sócios cooperados vivem momentos de apreensão. Não são raros os momentos que vêem sua sociedade instada pela justiça a comprovar sua idoneidade, como se fossem, por premissa, irregulares. Esse fato tem provocado no seio das cooperativas de trabalho fortes turbulências, que, por conseqüência, afeta sua gestão e, muitas vezes, o próprio futuro. A tensão social provocada por essas circunstâncias tem, injustificadamente, levado muitas cooperativas de trabalho à liquidação.

Nesse contexto é que a OCB vem se posicionar. É certo que a consolidação de elementos que permitem a da identidade de uma cooperativa de trabalho é extremamente complexo. Sua consolidação, por assim dizer, envolve a análise delicada de vários campos do direito pátrio, direito comparado, da contabilidade, sociologia, economia, da gestão cooperativista, que devem precisamente refletir os interesses dos sócios cooperados.

A OCB, sensível ao momento delicado pelo que passam as cooperativas de trabalho se impôs tal desafio. Desse esforço nasceu o presente documento denominado de "Critérios para a identificação da cooperativa de trabalho".

A sua intenção foi, definitivamente, posicionar-se apresentando à sociedade o que identifica como sendo uma cooperativa de trabalho adequada. Para tanto, estabeleceu algumas premissas que serviram de balizas na condução de seu posicionamento.

No Brasil de hoje, segundo critérios da Organização das Cooperativas Brasileiras - OCB, existem 13 ramos de atuação econômica do cooperativismo, e o ramo trabalho é um deles.

A cooperativa enquanto sociedade de pessoas possui apenas uma natureza e estrutura, independente do ramo, sendo o objetivo sempre o mesmo, isto é, a prestação de serviços ao cooperado, diferenciando apenas no objeto.

Da análise da estrutura da lei cooperativista se depreende que a relação jurídica havia entre o sócio cooperado e a cooperativa é relação sujeita ao ramo do direito societário, (para alguns autores direito cooperativo e para outros direito civil), mas é certo que nunca direito do trabalho.

Sobre tais elementos, entendemos que o sócio cooperado deve preliminarmente estar informado da estrutura da sociedade cooperativa, seus direitos e responsabilidades, inclusive com relação a terceiros, conforme dispõe o artigo 12 da Lei 5.764/71 e artigo 1.095 do Código Civil. Uma vez devidamente informado deve possuir a vontade de ser sócio cooperado.

Ser sócio cooperado significa ser ao mesmo tempo: proprietário, dono de parcela da sociedade, possuir portanto cotas-partes; usuário da cooperativa, sendo-lhe fiel e utilizando-se da prestação de serviços, causa de seu ingresso na sociedade; e fornecedor, ou seja, a cooperativa age com base na “matéria/produto/serviço” de propriedade do cooperado e entregue ou posta a disposição, por ele, na cooperativa.

A sociedade cooperativa, nos termos do capítulo VII do Código Civil, da Lei Cooperativista e dos princípios da Aliança Cooperativa Internacional, deve ter caráter auxiliar e possuir identidade de vontades com o cooperado, coletivamente considerado.

Os atos e negócios devem ser praticados no âmbito dos objetivos sociais, que convergem com o artigo 3º da lei cooperativista, ou seja, contrato de vontades para o exercício de uma atividade econômica de proveito comum.

Isto posto, estando presentes, os elementos comentados, a relação é de direito societário, excluindo, portanto outras. Todavia não presentes, aplica-se as normas regentes de outra relação jurídica.

Entretanto, tal orientação não pode ser admitida de maneira nenhuma como porta aberta para a precarização das relações de trabalho. Embora adotem premissas e proponham soluções conceitualmente diferentes, o Cooperativismo e o Direito do Trabalho comungam da compreensão do trabalhador como ente sócio-econômico que demanda dignidade e defesa. Afinal, são valores do cooperativismo, tal como expresso no Congresso Centenário da Aliança Cooperativa Internacional, ocorrido em Manchester (set./95):

“As cooperativas baseiam-se em valores de ajuda mútua e responsabilidade, democracia, igualdade, eqüidade e solidariedade. Na tradição dos seus fundadores, os membros das cooperativas acreditam nos valores éticos da honestidade, transparência, responsabilidade social e preocupação pelo seu semelhante.”

Urge esclarecer de pronto que a importância do cooperativismo do trabalho não está exatamente em atender conjunturalmente uma demanda das empresas por relações de trabalho mais flexíveis, ou em baratear custos com mão de obra. Essas podem ser até conseqüências da introdução do cooperativismo de trabalho numa determinada economia, mas não são a sua razão de ser. A razão de ser da cooperativa de trabalho é a autogestão.

Portanto, a existência de cooperativas de trabalho não pressupõe nem depende do sacrifício de seus direitos fundamentais pelo trabalhador individualmente considerado.

2. DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.1 DO CONTEXTO

Inicialmente, reconhece a OCB que a natureza jurídica da relação de trabalho cooperado se encontra, sob a ótica do direito, em um campo aberto, ainda não esgotado.

Há consenso na doutrina jurídica internacional do que deve se diferenciar entre a relação jurídica-trabalhista e a relação jurídica-cooperativista. No caso das cooperativas de outros ramos, não há ocasião de conflito entre as regras trabalhistas e os valores cooperativistas. Entretanto, podem surgir conflitos, quando o que se está submetendo ao regime cooperativo é nada menos do que o próprio trabalho.

O Direito do Trabalho clássico (brasileiro) preconiza que a garantida da dignidade do trabalhador, na condição de exercente de uma atividade laborativa como empregado só é viável com a intervenção estatal, uma vez que só o Estado é capaz, por meio de normas de contenção, estabelecer os limites do capital frente à seu empregado. Parte-se da premissa, portanto, da necessidade da tutela estatal que visa, em última instância, a proteção do empregado na sua condição de hipossuficiência.

Porém, se os princípios gerais devem ser observados, é inadequada a mera sujeição do trabalho cooperativado ao arcabouço jurídico construído pelo Direito Trabalhista (hipossuficiência do trabalhador). Pode-se demonstrar isso a partir da inaplicabilidade direta do sistema regente tripartite. Este modelo apresenta três protagonistas: os empresários, os trabalhadores (empregados) e o Estado. Os três protagonistas se inter-relacionam e produzem códigos que regem as relações de trabalho dentro do paradigma de sua realidade heterogestionária e da hipossuficiência.

Entretanto, as cooperativas de trabalho concentram num único agente social (protagonista) papeis que as sociedades em geral separam: são proprietários da cooperativa ao mesmo tempo em que são seus provedores de força de trabalho. Trata-se do princípio da identidade, ou da dupla qualidade que caracteriza o cooperado.

Essa estranheza em relação ao modelo tradicional não pode se prestar à recusa no estabelecimento das cooperativas de trabalho em qualquer atividade e mercado abertos à outras formas societárias heterogestionárias, pois a cooperativa é um tipo jurídico de comprovada eficácia na promoção humana. Exige sim esforço criativo para o encontro de soluções normativas próprias, que contemplem os princípios universais de salvaguarda do trabalho, sem que se violente os valores do cooperativismo.

As cooperativas de trabalho não podem, para a identificação de sua natureza jurídica, serem analisadas sob a ótica exclusiva do Direito do Trabalho, visto que este, historicamente, é constituído de normas de contenção, ou seja, comandos legais que visam conter o mando do capital frente ao trabalhador, quando submetido este à relação de emprego.

Poder-se-ia afirmar que o partícipe de uma cooperativa de trabalho é um trabalhador autônomo. No entanto, reconhece a OCB que essa figura não é suficiente, porque o exercício da atividade laborativa nesse modelo (associativo) pode implicar na perda da autonomia plena do sócio cooperado, que nessa condição pode passar a ter autonomia relativa. A perda da autonomia plena pelo sócio cooperado não implica, no entanto , que esse passe a se enquadrar automaticamente na condição de hipossuficiência, visto que não está submetido diretamente ao poder e conseqüentemente ao mando de um agente econômico detentor de capital.

Mais adequado seria então tratar essa realidade sob a ótica do Direito Civil, que preconiza a existência de uma relação civil entre sócios cooperados que constituem uma cooperativa de trabalho ? Esta é uma premissa real, no entanto também não suficiente para identificar a natureza de uma cooperativa do ramo trabalho. Isto porque a cooperativa de trabalho, embora seja uma sociedade, transpirando todos seus elementos civis, na consecução de sua atividade econômica, preconiza a idéia de que está só se materializa mediante a coordenação da força de trabalho de seus sócios. Eis os elementos que fazem da cooperativa de trabalho um tipo de cooperativa, inclusive para o próprio sistema OCB, como peculiar.

Porém, para avançar nessa questão, já que está preconizando a identificação da natureza jurídica da relação de trabalho cooperado, melhor seria trilhar no campo do direito que permitisse a extração da essência da cooperativa de trabalho, sem que esta venha impregnada de elementos de Direito do Trabalho ou de Direito Civil, de forma que uns predominem sobre outros. Defende a OCB o avanço da reflexão sobre as cooperativas de trabalho sob a ótica do Direito Cooperativo. Neste passo, a OCB adota o conceito contido na Declaração Mundial sobre as Cooperativas de Trabalho aprovada pela Assembléia Geral da CICOPA – Organização Internacional de Cooperativas de Produção Industrial, Artesanal e de Serviços em 06/IX/2003, com redação final aprovada por seu Comitê Executivo em 17. II. 2004:

“Em particular, é necessário que os Estados reconheçam em suas legislações que o cooperativismo de trabalho associado está condicionado por relações trabalhistas e industriais distintas do trabalho dependente assalariado e do auto emprego ou trabalho individual independente, e aceitem que as cooperativas de trabalho associado apliquem normas e regulamentos correspondentes. “


O direito ao trabalho digno, consagrado na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, arts. 23 e 24, nas Convenções e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho, bem como a Declaração Mundial sobre as Cooperativas de Trabalho e a Carta de Montevideo, que fixou as diretrizes da CICOPA Américas, aprovado no Primeiro Encontro das Cooperativas de Trabalho das Américas, ocorrido em 28-29/XI/1998, são certamente as pedras fundamentais que irão consubstanciar toda a construção da identidade da cooperativa de trabalho. Portanto, os sócios de uma cooperativa de trabalho estão abarcados pelas normas de ordem pública, no que tange o exercício de suas atividades: dignidade, segurança, saúde e medicina do trabalho.

A Organização Internacional do Trabalho - OIT, em sua Recomendação 127, definia a Cooperativa como associação de pessoas que se uniram voluntariamente para realizar objetivo comum, através da formação de uma organização administrada e controlada democraticamente, realizando contribuições eqüitativas para o capital necessário e aceitando assumir de forma igualitária os riscos e benefícios do empreendimento no qual os sócios participam ativamente.

A 90ª Conferência da OIT, em 20.06.2002, revisou a Recomendação 127 e, recepcionando os Princípios de Identidade Cooperativista, na forma emanada do Congresso Centenário da Aliança Cooperativa Internacional (Manchester, 1995), definiu a Cooperativa como uma associação autônoma de pessoas unidas voluntariamente para satisfazer suas necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais em comum através de uma empresa de propriedade conjunta e de gestão democrática (Recomendação 193).

Decompondo analiticamente as definições, encontramos seus três elementos formadores do conceito:

- é uma sociedade de pessoas que possuem aí uma dupla qualidade: são as titulares da sociedade e usuárias dos serviços desta (satisfazem suas necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais);
- possui gestão democrática (regime de autogestão);
- realiza distribuição eqüitativa entre riscos e benefícios dentre seus associados (empresa de propriedade comum).

A Lei 5.764/71, regente das sociedades cooperativas, consagra o princípio doutrinário da sua dupla natureza: uma natureza social, porque pressupõe a participação solidária dos associados na condição simultânea como empresários e usuários do empreendimento - portanto, interagem politicamente no ambiente social através da Cooperativa; e uma natureza societária, porque a missão de uma cooperativa é sempre o desenvolvimento econômico de seus associados.

Uma Cooperativa se forma entre pessoas que se comprometem a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica de proveito comum. No caso da Cooperativa de Trabalho isto significa que os associados podem reunir condições para a sua própria atuação no mercado com a aquisição de tecnologia, investimento em marketing, suporte jurídico, financeiro, administrativo, comercial e de desenvolvimento de novas atividades, aperfeiçoamento e atualização profissional e assistência técnica e social. Os associados se servem da cooperativa para acessarem o mercado em condições similares às das empresas prestadoras de serviços

O suporte dado pela Cooperativa é viabilizado pela sua atuação empreendedora, tendo como base primordial o retorno aos associados do resultado das suas atividades laborativas, deduzidos exclusivamente os tributos e contribuições sociais incidentes e os custos administrativos e de investimento necessários, que são rateados na proporção da fruição de cada um dos serviços da Cooperativa.

É claro que uma relação de trabalho pode ser objeto da legislação cooperativista. Afinal, o art. 5° da Lei 5.764/71 dispõe:

“As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou atividade.”

Ocorre que é o trabalho igualmente objeto da legislação celetista. Fixar a prevalência de uma legislação em detrimento da outra num caso concreto, isto é, situar os limites de legalidade da atuação das cooperativas de trabalho não é uma tarefa fácil. Nesse aspecto, alguns defendem que as cooperativas de trabalho não podem se sujeitar às diretrizes impostas pelo Direito do Trabalho, compreendido, em sentido estrito, aquelas normas que versam do trabalho com vínculo de emprego, o que é certo. Porém, não se pode concluir, de forma genérica, e pelo mesmo motivo, que as cooperativas de trabalho não se sujeitam a nenhum princípio em comum com o Direito do Trabalho. E aqui se reforça a idéia que o cooperativismo de trabalho se fundamenta no direito ao trabalho e não direito do trabalho (Consolidação das Leis do Trabalho). No entanto, estabelecer os limites de atuação nos respectivos campos é tarefa, como já dito acima, das mais difíceis.

No Brasil, a polêmica sobre os limites de legalidade da atuação das cooperativas de trabalho tomou lugar num contexto muito particular: a inserção de cooperativas de trabalho em processos de terceirização. Como entender a inserção de cooperativas de trabalho em processos lícitos de terceirização na condição de prestadoras de serviços, a partir da situação fática encontrada na relação de trabalho que envolve o seu associado e os contratantes tomadores dos serviços destes? Mesmo que , sob o aspecto do Direito do Trabalho, a cooperativa de trabalho, pela inexistência da figura do empresário que, na consecução de obtenção de lucro, se apropria da força de trabalho alheia, desenvolva uma "terceirização atípica", seria justo, por esse motivo, limitar sua participação em processos lícitos de terceirização tanto frente ao poder público quanto na iniciativa privada? A resposta evidentemente é negativa.

Tal resposta negativa se baseia na Recomendação 193, aprovada na 90ª Conferência da OIT. O seu item I.1 reconhece que as cooperativas operam em todos os setores da economia. E por seu item 7.2., as cooperativas devem beneficiar-se de condições conforme com a legislação e as práticas nacionais que não sejam menos favoráveis que as que se concedam a outras formas de empresa e de organização social. Se a prestação de serviços terceirizáveis é considerada como objeto lícito às sociedades empresárias, também deve sê-lo para as sociedades cooperativas.

Ora, ainda que organizados os associados de cooperativas de trabalho em equipes hierarquizadas para prestação de serviços, preservada a impessoalidade em relação ao tomador dos serviços, não resta desnaturada a autonomia dos mesmos para efeitos de legislação trabalhista, por inexistir no caso a hipossuficiência. A subordinação jurídica de que trata o art. 3° da CLT não se configura, ante os princípios da soberania assemblear e da singularidade de voto que presidem a sociedade cooperativa (regime de autogestão).

Entretanto, há quem, sob a pecha de cooperativas de mão-de-obra, conceito jamais reconhecido pelo sistema cooperativo, têm jogado na vala comum todas as cooperativas de prestadores de serviços terceirizáveis organizados de forma hierárquica, ainda que preservada a autonomia diretiva, técnica e disciplinar em relação o tomador de serviços. Basta que se observe horários, procedimentos e rotinas para a já banalizada acusação de fraude. Interpretam a CLT para afastar as cooperativas das terceirizações consideradas lícitas mesmo com base no Enunciado TST 331 e no Decreto 2.271/97.

Em que pese a louvável preocupação dos eméritos operadores do Direito do Trabalho que assim pensam, tal solução não atende a Recomendação OIT 193, posto que restam tratadas as cooperativas de forma menos favorável que as empresas, por negar àquelas acesso a um relevante mercado, como é o de prestação de serviços terceirizáveis. A inserção das cooperativas de trabalho nas dependências de uma empresa, que poderá inclusive optar nesse momento, pelo desmembramento de sua atividade econômica, não pode de per si servir de limitadora para a atuação destas no contexto da terceirização, mesmo que esta terceirização, para o Direito do Trabalho, seja atípica. Seria, nesse caso o óbice se consumasse a consagração da discriminação.

Assim sendo, urge neste contexto a observância do item II.6.c da Recomendação OIT 193: estabelecer uma política favorável às cooperativas e compatíveis com a sua natureza, inspirados nos valores e princípios cooperativos com vistas à adoção de medidas de supervisão que respeitem a sua autonomia e sejam conformes com a legislação e a prática nacional e não sejam menos favoráveis que as medidas aplicáveis a outras formas de empresa e de organização social. E isso sem prejuízo ao seu item 8.1.b, pelo qual as políticas nacionais deveriam especialmente velar para que não se possam criar ou utilizar cooperativas para burlar a legislação do trabalho nem elas sirvam para estabelecer relações de trabalho encobertas e lutar contra as pseudo-cooperativas, que violam os direitos dos trabalhadores, velando para que a legislação de trabalho se aplique em todas as empresas.

2.2 DOS CONCEITOS LEGAIS

2.2.1 O Ato cooperativo de trabalho

O ato cooperativo é um conceito fundamental em torno do qual se erige a legislação e a doutrina aplicável às cooperativas não somente no Brasil , mas em toda a América Latina. A teoria do ato cooperativo encontrou repercussão e projeção nos Congressos Continentais de Direito Cooperativo realizados pela Organização das Cooperativas da América. A Carta de Mérida (I CCDC, 1969), em seu item 1.4. consolidou a noção conceitual de ato cooperativo:
“1.4 Que entre os elementos essenciais dos atos especificamente cooperativos, que permitem sua diferenciação frente a toda classe de atos cooperativos, se encontram:
A) SUJEITO: O cooperador, nesta condição e a cooperativa, enquanto está constituída e funciona de acordo com os princípios cooperativos universalmente aceitos;
B) OBJETO: De acordo com os fins da cooperativa; e
C) SERVIÇO: sem ânimo de lucro.”

A Carta Jurídica de San Juan (II CCDC, 1976) por sua vez desdobrou o conceito do ato cooperativo de trabalho:
"Constitui expressão particular - que a lei deve definir claramente - o princípio de que a relação entre o trabalhador associado a uma cooperativa de produção ou trabalho e esta é uma relação associativa que estabelece o vínculo jurídico determinado pelo estatuto. Esse vínculo exclui toda a relação de dependência trabalhista, porquanto a execução da tarefa constitui o cumprimento do objeto social que o estatuto determina. Isso sem prejuízo da inclusão deste trabalhador associado nos sistemas de seguridade social vigentes em seus respectivos países.".
As conclusões de Rosário (III CCDC, 1986) apontam foco para a sua incidência tributária, sem prejuízo à preocupação com a natureza jurídica do ato cooperativa e sua expressão face à matéria trabalhista, questões presentes já na Carta Jurídica de San Juan.

As deliberações de Brasília (IV CCDC, 1992), além das abordagens já encontradas nos Congressos anteriores, tratam da atividade de crédito. Relevante foi a manifestação para que a definição do ato cooperativo inscrita no Projeto da Lei Marco para as Cooperativas devesse ser adotada por sua positividade e clara redação.

O ato cooperativo encontra-se definido no art. 7° da Lei Marco:

“Art. 7° - São atos cooperativos os realizados entre as cooperativas e seus sócios ou por cooperativas entre si em cumprimento de seu objetivos social e ficam submetidas ao Direito Cooperativo. Os vínculos das cooperativas com seus trabalhadores dependentes se regem pela legislação trabalhista.”

O primeiro efeito que o conceito de ato cooperativo traz ao tema é fixar adequadamente o alcance do seu regime jurídico próprio, a par de qualquer critério taxinômico que se adote para classificar e agrupar cooperativas (cooperativas de trabalho associado, cooperativas de mão de obra, cooperativas de produção, cooperativas industriais etc). Desse modo, o conceito importa em reconhecer um regime jurídico comum às relações entre a cooperativa e o seu trabalhador associado, cujo objeto seja a produção de bens materiais ou imateriais (serviços) e sua finalidade seja satisfazer uma necessidade ocupacional, em seu sentido laborativo ou profissional.

Os atos cooperativos, em seu conjunto - sejam quais forem - se prestam a um determinado custo agregado, segundo as condições de mercado e da própria cooperativa. Este custo agregado, ao longo do ano, somente pode ser projetado, pois o valor definitivo se conhecerá ao fim do exercício econômico, quando se realiza o balanço.

Assim, ao projetar o custo agregado do seu funcionamento ao longo do ano, a cooperativa fixa um valor de provisionamento para o rateio de suas despesas com atos cooperativos a ser suportado pelos associados na proporção da fruição destes serviços, conforme dicção do art. 80 da Lei 5.764/71.

Conseqüentemente, quando finaliza o ano social e se pratica o balanço, surgirá uma diferença para mais ou para menos sobre aquele preço provisório, deduzidos os custos de investimento e de assistência, caracterizados classicamente pelos Fundos de Reserva e FATES. Esta diferença (geralmente positiva, quando a administração tiver sido eficiente) é o que se chama "sobras retornáveis" ou "sobras líquidas do exercício" , ou seja a diferença exata entre o custo projetado e o custo real dos serviços prestados aos associados.

Esta sobra se distribui entre os associados como retorno em proporção dos serviços utilizados por cada ano durante o exercício. O excedente, em suma, é o que a cooperativa recebeu a mais, no momento em que este fez uso de seus serviços. Daí que este excedente - com a prévia constituição dos fundos e pagos os juros de capital - deva ser devolvido, 'retornado', ao associado como reajuste sobre aquele o custo projetado, configurando-se desta maneira o custo real.

O retorno da sobra é conseqüência da impossibilidade prática de se calcular exatamente o seu custo real, no momento de se prestar o serviço. Como em todo caso se deve cobrar nessa oportunidade algum valor para que a cooperativa possa se desenvolver normalmente, se toma comumente como base o valor de mercado de mercado.

Exatamente da mesma maneira se sucede no caso da cooperativa de trabalho: o associado utiliza o serviço social - a captação de clientela, mediante contrato com terceiros e a cooperativa lhe adianta um valor (em última análise semelhante ao que, por exemplo, antecipa a cooperativa agropecuária ao associado que entrega sua produção por conta do preço final), a título de remuneração pessoal, de caráter alimentar.

Como não pode predefinir com precisão qual será o resultado do exercício, a cooperativa adianta preço de mercado vigente no momento. E qual será o preço de mercado que a cooperativa de trabalho adiantará ao associado que usa seus serviços? Como é fixado? Normalmente, terá por referência a remuneração salarial ou de honorários usualmente praticada no mercado para os empregados ou profissionais autônomos da mesma atividade. A diferença entre este valor e o valor negociado com os clientes, ela retém.

Ao fim do exercício - como antes se indicou – estará a cooperativa em condições de determinar o custo agregado dos atos cooperativos praticados , uma vez conhecido o resultado econômico anual. Nesse momento - já aprovado o balanço - se procederá retornar aos associados o que a cooperativa lhes pagou a menos durante o ano . Desta maneira, a sobra se integra ao valor de remuneração, integralizando-a.

Ou seja, a remuneração integral do associado, pela prestação de serviços a clientes captados pela Cooperativa, só se conhece ao final do exercício social, posto que ele é, na verdade a soma da remuneração já repassada ao longo do ano e das sobras líquidas do exercício distribuída .

E como a lei garante que tal dinâmica efetivamente funcione? Simples: o artigo 24, §3º, veda às cooperativas distribuírem qualquer espécie de benefício às quotas-parte ou estabelecer outras vantagens ou privilégios, financeiros ou não, em favor de quaisquer associados ou terceiros, excetuando-se os juros de até no máximo de 12% ao ano, incidente sobre a parte integralizada.

Se a cooperativa de trabalho desrespeitar o disposto neste artigo, estará então desviando-se de sua finalidade. Ou seja, um dos critérios de aferição para verificação se a cooperativa mantém-se fiel às suas finalidades é verificar a existência de proporcionalidade razoável entre aquilo que o associado deixa para a cooperativa, a título de rateio de despesas (artigo 80 da lei nº 5.764/71), comumente denominada de taxa de administração, e os serviços que a cooperativa presta ao seu associado através da sua atuação no mercado, oferecimento de infraestrutura, aquisição de tecnologia, realização do marketing, administração dos contratos, negociação com os clientes, treinamento e qualificação profissional e estabelecimento de uma política de benefícios e seguros - o que consubstancia o segundo elemento da dupla qualidade de associado: o de usuário da cooperativa, tal como consagra o artigo 4º, caput, e artigo 7º da lei nº 5.764/71.

Sob o enfoque operacional, enfim, as cooperativas de trabalho poderiam ser validamente definidas da seguinte forma:

ORGANIZAÇÃO DE PESSOAS FÍSICAS, REUNIDAS PARA O EXERCÍCIO PROFISSIONAL EM COMUM E EM REGIME DE AUTOGESTÃO, TENDO COMO BASE PRIMORDIAL O RETORNO AO COOPERADO DO RESULTADO DA SUA ATIVIDADE LABORATIVA, DEDUZIDOS EXCLUSIVAMENTE OS TRIBUTOS E OS CUSTOS ADMINISTRATIVOS E DE INVESTIMENTO

2.2.2 Os Direitos Constitucionais dos Trabalhadores

A análise do artigo 7º da Constituição Federal deve se desenvolver à luz dos princípios garantidores da dignidade da pessoa humana consagrados pelos arts. 23 e 24 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, as Convenções e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho. É por essa razão que alguns direitos contidos no artigo 7º da Constituição Federal estendem-se tanto para os trabalhadores empregados quanto para os trabalhadores em geral, dentre eles os sócios cooperados. Nesse sentido, a interpretação do mandamento constitucional não será restritiva.

O vocábulo “trabalhadores” utilizado pela Constituição, em seu artigo 7º é genérico. Por assim dizer, trabalhadores são todos aqueles que exercem atividade laborativa, independentemente de estarem ou não empregados. Observa-se, nesse aspecto que a OCB não defende a simples aplicação dos direitos ali consagrados para todos os trabalhadores de forma literal, visto que a redação do dispositivo constitucional está impregnado pelo paradigma celetista, o que, por conseqüência natural, excluiria os trabalhadores autônomos, por exemplo.

Se assim é, então a Carta Magna, com exceção dos incisos específicos para a relação de emprego, preconiza, por meio de seu artigo 7º, a idéia de que os trabalhadores estão abarcados por direitos que lhes são inerentes, simplesmente por esse fato. Dessa forma, pretende-se, na verdade, por meio de interpretação sistêmica e finalística, abarcar os sócios cooperados, em cooperativas de trabalho, com os ditames previstos em determinados incisos do artigo 7º. A fundamentação segue a seguinte linha:

A Constituição Federal, em seu artigo primeiro, expressa que a República Federativa do Brasil, enquanto estado democrático, é constituída nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV). Ou seja, o primeiro fundamento maior refere-se àquele que efetivamente é o criador e gerador de riquezas, o trabalho, em sentido amplo e o trabalhador, em sentido estrito. O segundo é relativo à livre produção e consumo de bens e serviços por meio da circulação harmônica de capital, o mercado consumidor. Eis o princípio distributivo da riqueza calcado nos aspectos da justiça social.

Avançando um pouco mais na busca do significado adequado do texto da Carta Magna, esta nos permite concluir que a organização e a vida da própria nação, compreendida dessa maneira, concretiza-se mediante a existência harmônica entre dois elementos facilmente identificados: relação de trabalho e de consumo.

Diante desse fato, infere-se inúmeras conclusões, tais como: todo o ordenamento jurídico, decorrente das premissas acima, deve estar voltado portanto, à valorização do trabalho enquanto gênero sustentáculo da dignidade da pessoa humana, bem como a produção, consumo e livre circulação de bens e serviços.

Assim sendo, podemos concluir que o artigo 6º da Constituição Federal (petição de princípios), combinado com o artigo 1º, deixa claro que os direitos sociais são aqueles fundamentais garantidores de uma existência digna independentemente da forma jurídica que a relação de trabalho irá tomar.

É evidente, portanto, que o trabalho (lato senso), diferentemente do emprego, é tratado na Constituição Federal como princípio. E, como todo princípio, é abrangente, ou seja, espraia-se sobre todo o ordenamento jurídico, ocupando posição de preeminência, e, por isso, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a boa aplicação das normas jurídicas que a ele se conectam.

O princípio da garantia ao trabalho digno se concretiza em regras traçadas pela própria Constituição Federal, representadas pelos direitos mínimos de todo e qualquer trabalhador, contidos no artigo 7º. A análise sistemática da Carta Magna, na busca dos direitos dos trabalhadores, permitem-nos estabelecer uma divisão clara e objetiva entre direitos inerentes e relativos à relação de emprego e aqueles que tratam de toda e qualquer relação de trabalho em sentido amplo.

A interpretação é sistemática, pois, em vários momentos, o nosso ordenamento jurídico maior preconiza o trabalho lato sensu, quando veicula inclusive a idéia de que o Estado de Direito se fundamenta na valorização do mesmo (trabalho), colocando-o como direito e garantia fundamental (cláusula pétrea), com a possibilidade de criação de associações ou cooperativas, na forma da lei (inciso XVIII do art. 5º), por exemplo.

Na verdade, admite a Constituição a existência de várias formas de desenvolvimento do trabalho, além daquela que ocorre por meio do vínculo empregatício, e que nem por isso há violação às regras mínimas estabelecidas pela mesma Constituição. Exemplo saudável nesse sentido é aquele que se consuma através do trabalho associativo, parassubordinado, onde o há a prevalência do princípio da autonomia da vontade sobre a tutela estatal automática, eis que a inexistência da condição hipossuficiente do trabalhador. Essa ausência se constata na medida em que o trabalho associativo consagra o mais básico dos direitos do trabalhador: a negociação coletiva das relações de trabalho, manifesto no exercício da soberania assemblear mediante o voto singular.

Pertine aqui lembrar o ensinamento de CARLOS TORRES Y TORRES LARA (Efectos del Acto Cooperativo en la distribuición, en el aprovisionamiento, en el trabajo asociado y en el sistema financiero. In: ORGANIZACIÓN DE LAS COOPERATIVAS DE AMERICAS. Derecho Cooperativo: Tendencias actuales en Latinoamerica y la comunidad Économica Europea. Bogotá : Ed. Antropos : 1993. pp. 18-19).:

“A personalidade jurídica da cooperativa somente se faz útil para efeitos de canalizar as operações em um centro de imputação único. A cooperativa poderia operar perfeitamente sem personalidade jurídica, em seu sentido social. Sua organização, coordenação e atividade produtiva nada tem a ver com a personalidade jurídica. Ela se faz necessária somente para efeitos de operar no mercado apresentando uma oferta, recebendo o pagamento, assumindo um conjunto de direitos e um conjunto de obrigações. Sempre ‘uno’, quer dizer, buscando a centralização dos direitos e obrigações.”
(....)
“Precisamente a cooperativa de trabalho é a negação do regime pelo qual o trabalho humano se converte em mercadoria. Não é mais do que trabalhadores associados que atuam em face ao mercado mediante um representante comum, que é a cooperativa.
“Um ponto distinto a este é o relativo aos direitos de cada trabalhador. A respeito, é possível a adoção de soluções similares ao direito trabalhista, não porque se trata de atos similares, mas porque a condição de trabalhador e suas necessidades são similares.”

Portanto, alguns comandos constitucionais poderiam ser estendidos para sócios cooperados atuantes nas cooperativas de trabalho. Não que isso engesse a dinâmica da atividade econômica da cooperativa. A idéia aqui é partir-se da premissa que a atividade laborativa dos sócios cooperados estão inseridos na “idéia” do texto constitucional.

Neste passo, concluiu o IV Congresso Continental de Direito Cooperativo, ocorrido em Brasília, entre 5 e 7 de Agosto de 1992 que:

“A cooperativa de trabalho deve atuar em todos os seus atos como cooperativa, durante o transcurso da relação associativa, e, se assim não o fizer, não pode depois invocar esse caráter em juízo, pois se poria em contraposição com seus próprios atos.
“É necessário – de lege ferenda – ditar normas que garantam direitos sociais dos trabalhadores associados, em matéria de seguridade e outros, descartando o que desnaturalizaria as cooperativas de trabalho, como as indenizações por despedida ou similares, que são próprios dos trabalhadores dependentes.”

2.3 DA APLICAÇÃO

Art. 7 - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

O artigo 7o. A Constituição Federal trata de direitos relativos aos trabalhadores. Entenda-se, por meio de interpretação sistemática, de que trabalhadores são aqueles que exercem atividade laborativa com ou sem vínculo de emprego. Admite-se que são trabalhadores os autônomos, tarefeiros, empreiteiros, cooperados, etc.

O texto constitucional informa que alguns direitos são inerentes tanto aos trabalhadores autônomos quanto aqueles que exercem atividade laborativa na forma de emprego. Como exemplo citamos as diretrizes relativas à segurança e medicina do trabalho. A saúde do trabalhador é um bem indisponível. Não há, por exemplo, como abdicar da utilização dos equipamentos de proteção individual.

Portanto, são elencados abaixo os incisos do referido artigo que a OCB convenciona sejam observados pelos sócios cooperados exercentes de atividades laborativa por meio de uma cooperativa de trabalho.

INCISO CONSTITUCIONAL
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada.
CONVENÇÃO
É então direito dos trabalhadores a execução das suas atividades laborativas dentro de uma jornada de trabalho que observe a saúde física e mental do trabalhador. Como se sabe, a extensão da jornada de trabalho, em trabalhos repetitivos, por exemplo, causa queda acentuada na produtividade, na atenção, colocando em risco a integridade física do trabalhador.
Entende-se que essa realidade, é certo, não se aplica para todas as cooperativas de trabalho, mas, por seu turno, não se pode ignorar que muitas destas exercem determinadas atividades no interior de empresas limitadas pelo próprio exercício do trabalho à uma determinada jornada de trabalho.
Assim sendo, essa diretriz constitucional deve servir de parâmetro, a fim de que o sócio cooperado, ainda que considerado autônomo, não se submeta à jornada que afete sua integridade física, principalmente quando este presta serviços contínuos. Nesse aspecto não pretende a OCB impingir às cooperativas de trabalho, ou mesmo defender a idéia de que todo e qualquer cooperativa de trabalho deva desenvolver suas atividades com seus sócios, limitados à uma jornada de trabalho absolutamente rígida. O que se pretende, na verdade, é respeitar o disposto no art. 24 da Declaração Universal dos Direitos Humanos:
“Todo homem tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.”
É norma de ordem pública, ou seja, não há como se admitir que um sócio cooperado que exerce suas atividades no interior de uma empresa e é exercente de trabalho mecânico, por exemplo, se submeterá à jornada de trabalho ilimitada.
Esse parâmetro normativo deverá aplicado para os sócios cooperados que prestam serviços contínuos. As negociações pertinentes a esse direito pode se consumar em documento específico gerado pela cooperativa e o tomador dos serviços. As partes podem ampliar a jornada de trabalho seguindo os ditames das normas de segurança e medicina do trabalho e mediante contraprestação compatível.

INCISO CONSTITUCIONAL
XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos.
CONVENÇÃO OCB
O descanso está atrelado à saúde do trabalhador independentemente de ser ou não empregado. Não se admitirá, por exemplo, a execução de trabalho sem o respectivo descanso. Nesse caso, trata-se de norma de ordem pública que serve também para o sócio cooperado. O descanso semanal remunerado, que pode ser aos domingos ou não, é um direito também do sócio cooperado. Mais uma vez, nada mais se faz do que observar o art. 24 da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
A remuneração naturalmente deverá ser proporcional ao volume de horas trabalhadas ao longo da semana. Pode a cooperativa incorporá-la na sua composição de custos, mediante provisionamentos, ou mediante formação de fundos.

INCISO CONSTITUCIONAL
XVII - gozo de férias anuais remuneradas.
CONVENÇÃO OCB
Férias, ou descanso anual é um outro elemento que está atrelado à saúde do trabalhador e configura Direito Humano. Deve ser observado pelas cooperativas de trabalho em caso de prestação de serviços contínuos. O descanso deve existir de fato, ainda que sua diminuição parcial possa ser financeiramente compensada e apresentar-se com suporte de ordem econômica.
Um provisionamento ou fundo específico voltado ao gozo de férias pode ser constituído nesse sentido pela cooperativa. Tal qual o repouso, o descanso anual também é naturalmente remunerado de forma proporcional.

INCISO CONSTITUCIONAL
XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias.
CONVENÇÃO OCB
Este inciso explicita de forma indelével e inequivocamente o quão a Constituição Federal está impregnada do paradigma da relação de emprego e que a literalidade de sua redação deve ser ponderada por uma interpretação sistêmica e finalística, já explicitada pela legislação ordinária. As mulheres cooperadas gozam desse direito. A própria condição de contribuinte individual para a Previdência Social confere à gestante o mesmo direito da trabalhadora empregada. Ou seja, a sócia cooperada, inscrita na Previdência Social, não está desprotegida, sob a ótica da licença maternidade.

INCISO CONSTITUCIONAL
XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.
CONVENÇÃO OCB
A redução dos riscos inerentes à execução do trabalho é condição essencial, tanto para aquele que exerce atividade laborativa sob a forma cooperada ou ainda na condição de empregado.

INCISO CONSTITUCIONAL
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei.
CONVENÇÃO OCB
É norma de ordem pública. Vale tanto para cooperados como trabalhadores empregados. O sócio cooperado que exerce suas atividades ambiente insalubre percebe o referido adicional de insalubridade, que deverá se consumar, nesse caso, de forma estatutária.

INCISO CONSTITUCIONAL
XXIV – aposentadoria.
CONVENÇÃO OCB
O sócio cooperado está totalmente protegido pela lei previdenciária. O arcabouço legal nesse sentido é amplo. É norma que vale tanto para empregado quanto para cooperado.

INCISO CONSTITUCIONAL
XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;
CONVENÇÃO OCB
A ausência até o presente momento de previsão legal que efetive o comando constitucional em favor do cooperado prestador de serviços contínuos revela a fragilidade de uma dicotomia subordinação/autonomia, sem que se compreenda a posição conceitual intermediária ocupada pela relação de trabalho associativa e portanto se dê conta da realidade das cooperativas de trabalho. É esta deficiência do estado das artes responsável em grande medida pelos atuais conflitos envolvendo as cooperativas de trabalho, pois, há quem opte por simplesmente negar para às cooperativas amplo acesso ao mercado de prestação de serviços, e quem opte por uma ausência de regras de proteção aos trabalhadores cooperados. Como facilmente pode-se depreender, nenhuma dessas opções atende as necessidades do trabalhador cooperado, deixando-o refém entre o desemprego e o trabalho precário
Não resta dúvidas de que a extensão da cobertura do cooperado, beneficiando-lhe com o seguro acidentário é algo necessário, bem como factível dentro dos padrões atuais da legislação previdenciária, tal como a Lei 10.666/2003 logrou estender a aposentadoria especial ao trabalhador cooperado.

3. PREVIDÊNCIA SOCIAL

Todos os sócios cooperados estarão obrigatória e necessariamente inscritos e protegidos pela Previdência Social, contribuindo conforme a Lei e o perfil profissiográfico profissional traçado . Ainda que contribuintes individuais, os cooperados são beneficiários da aposentadoria especial, refletindo adequadamente a condição sui generis da relação de trabalho cooperativista.


4. SEGUROS

É recomendável que as cooperativas de trabalho façam apólices de seguro de vida e de diária por incapacidade temporária. Seria recomendável, sobretudo enquanto a legislação previdenciária não os beneficie, os sócios cooperados fossem contemplados e usufruíssem de apólices de seguros contra acidentes de trabalho. Porém, a ausência de regulação pertinente do Conselho Nacional de Seguros Privados sobre este produto não contribui para que as cooperativas possam contar com ele.

5. IMPOSTO DE RENDA

Aplicam-se à remuneração repassada aos associados, as regras de retenção e informações (DIRF) de imposto de renda na fonte previstas para a sua atividade profissional.

6. SOBRA

As sobras retornadas não se confundem com os repasses das remunerações pelos serviços prestados por cooperados de cooperativas de trabalho. Tampouco ambos se distinguem por mero lançamento contábil arbitrário. As sobras são eventos de um ajuste de contas no exercício social. Denominar como sobras antecipadas valores oriundos dos tomadores e, desde os respectivos ingressos na cooperativa, estejam destinados aos cooperados que lhes tenham prestado serviços não se configura meio eficaz de planejamento tributário. Trata-se de um ilícito, se não integrados à base de cálculo dos tributos incidentes sobre a remuneração dos cooperados.

7. REGISTRO NA OCB/OCE

O registro é uma obrigação emanada de Lei (art. 107, Lei 5.764/71) para fins de monitoramento do sistema cooperativo. Monitorar significa advertir, repreender ou admoestar . O comando para o monitoramento está contido no art. 11 da MP 2.168-40 .

De forma alguma a exigência de registro esbarra no art. 5°, XVIII da Carta Magna, in verbis:

“a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.

O registro em comento é exigência legal que complementa a criação de cooperativas e não interfere na liberdade de criação de cooperativas conferida pela Constituição Federal. Portanto, a priori, o registro se encaixa na forma admitida pela Constituição Federal.

E, ao impor o registro, o Estado assume a condição de agente normativo e regulador da atividade das cooperativas, sob amparo do art. 174 da Constituição Federal. Apenas delega à OCB uma ação instrumental, ao determinar a esta entidade que realize os registros.

O registro cumpre, pelo menos, duas funções: informativa e declaratória. A informativa se prende à atualização de um cadastro único de cooperativas existentes no país. Este cadastro, publicado na forma de Anuário, tem sido a principal fonte de informações acerca do cooperativismo brasileiro e instrumento importante para o planejamento e incentivo previsto na norma constitucional (art. 174).

A segunda função é a declaratória. O registro se dá mediante a apresentação pela Sociedade de seus atos constitutivos. O registro somente é concedido após o confronto dos atos constitutivos com a Lei de regência das cooperativas. Isto é, o registro só é feito, se regulares os atos constitutivos da sociedade cooperativa. Trata-se portanto da verificação de um requisito do regular funcionamento da cooperativa. Evidentemente só é possível o regular funcionamento da cooperativa, se regular for a sua constituição.


8. ÁREA DE ADMISSÃO

O art. 4°, XI, da Lei 5764/71 estabelece que a área de admissão de associados é limitada às possibilidades de reunião controle, operações e prestação de serviços.

A cooperativa que possuir cooperados, mantiver filiais, sucursais, entrepostos e outras unidades administrativas descentralizadas , se localizadas há mais de 50 (cinqüenta) quilômetros da sede, providenciará os meios para que os cooperados exerçam seus direitos sociais, ou observará as disposições dos parágrafos 2o. a 6o. do art. 42 da Lei 5.764/71.
9 PROCEDIMENTOS LICITATÓRIOS

Todas as cooperativas poderão participar de processos licitatórios, em atenção aos princípios da igualdade, da isonomia, da economia e da impessoalidade, seguindo as disposições contidas na Lei n 8.666/94 ;

10 FORMA DE REMUNERAÇÃO DOS SÓCIOS COOPERADOS

O valor repassado ordinariamente aos associados das cooperativas de trabalho é denominado produção. É vedado às referidas sociedades cooperativas firmar contratos que precarizem as relações de trabalho, não se admitindo que o valor da produção dos associados seja inferior aos pisos das categorias. Nos contratos com a iniciativa privada, será observado o preço de mercado, devendo a cooperativa realizar reunião com os associados que se interessarem pela realização do trabalho, expondo-lhes as exigências e valores contratados, para fins de deliberação específica sobre as condições para a execução dos serviços e remuneração percebida. Poderá a Assembléia Geral deliberar anualmente sobre a forma de fixação dos valores dos repasses de serviços pessoais prestados pelos associados, periodicidade e jornada de trabalho, descanso semanal e anual, licenças e prestação de serviços fora do seu domicílio . A Assembléia Geral poderá fixar como as licenças e descansos serão remunerados, definindo forma, valores e custeio, bem como poderá estabelecer outros direitos para os associados, além daqueles definidos em Lei.

É obrigatória a observação do princípio da desconcentração de renda e do capital. Em atenção a este princípio, é recomendado que os ocupantes do cargo executivo mais elevado e demais diretores eleitos nas cooperativas do Ramo Trabalho, não recebam a título de pró-labore, mais que 15 vezes o valor limite para isenção do IRRF-PF . Ressalvada a realidade de mercado onde a cooperativa atue, no que tange aos pró-labores pagos aos gestores.

O referido limite não se aplica à produção dos associados, pelos serviços vendidos através da Cooperativa. Fundamentado no princípio de boa gestão e disposições do art. 44, IV da Lei 5.764/71 , caberá a Assembléia Geral estabelecer essas remunerações. Recomenda-se que, quando a Assembléia admitir remunerações variáveis, defina sempre um teto para as mesmas.


11 COOPERATIVAS MULTIPROFISSIONAIS

É admitida cooperativa multiprofissional que atendam as seguintes características:

a) possua objeto definido, finalidade típica e interesse comum.
I) Por objeto definido entende-se: a atividade profissional (serviço) que a sociedade cooperativa realiza (oferta) no mercado (negócio de meio, ou seja, o serviço prestado pelos cooperados e que é contratado com terceiros tomadores) e que tem de estar descrito no estatuto da cooperativa. A cooperativa pode ter mais de uma atividade (serviço ofertado) como objeto, mas elas devem formar um conjunto congruente exposto taxativamente no estatuto. A congruência, notadamente no que tange a amplitude do objeto, é percebida em correlação com a área de ação da cooperativa e de admissão de seus associados, de forma a permitir a presunção de affectio societatis (identidade/afinidade) entre os cooperados.
II) Finalidade típica: prestar serviços aos seus associados, defendendo seus interesses econômico-sociais de caráter comum, praticando operações em seu nome ou por sua conta, por meio de atos cooperativos, para obterem em comum melhores resultados para cada um deles em particular;
III) Interesse Comum: é o nexo lógico entre o objeto e a finalidade da Cooperativa. A existência do interesse comum faz com que o alcance da finalidade para um cooperado pela realização do objeto societário aproveite a todos.
b) mantenha estrutura organizacional e registros contábeis em separado, de forma a permitir apuração de resultados por atividade, conforme disposições do art. 80 da Lei 5764/71 e NBC-T 10.8, aprovada pela Resolução 920/2001, do Conselho Federal de Contabilidade;
c) observe as demais disposições deste instrumento, em especial, a democratização da gestão e a desconcentração de renda;

12 ADMINISTRAÇÃO

O trabalhador que realizar funções administrativas delegadas por diretores e administradores eleitos, mesmo que associado à Cooperativa, terá seu vínculo de emprego devidamente reconhecido, devendo ser obedecido o disposto no art. 31 da Lei 5.764/71.
Não se aplica a referida regra aos cooperados alocados no exercício de atividades administrativas ou de apoio em equipes formadas para a consecução do objeto da cooperativa (serviços contratados com os tomadores da cooperativa).
Cumpre observar que somente podem se cooperar aqueles aos quais a cooperativa poderá tecnicamente prestar-lhe serviços. Esta possibilidade é constatada a partir do exame do objeto da cooperativa. Deste modo, no quadro social e por conseqüência nos cargos eletivos da cooperativa é inadmissível a presença de pessoas cujo perfil profissional seja estranho ou destoante em relação ao objeto societário. Ressalvada no entanto a multiprofissionalidade de que trata o item 11

13 DENOMINAÇÃO

Recomenda-se a denominação Cooperativa de Trabalho, visto que este é o nome do ramo que a identifica.

14 AUTONOMIA TÉCNICO-DIRETIVA

Em atenção ao principio da primazia da realidade, não se confundem responsabilidade técnica com a de gestão e administração da sociedade; a responsabilidade técnica decorre da formação acadêmica/profissional, prevista em Lei; a gestão da sociedade decorre do processo eletivo, democrático, conforme definições estatutárias. Destarte, inexiste subordinação funcional decorrente da responsabilidade técnica, mas exercício do direito profissional delegado pelo Estado ao trabalhador habilitado;


15. CRITÉRIOS DE LEGITIMIDADE

15.1 ADESÃO LIVRE E CONSCIENTE

A adesão livre e consciente do associado à Sociedade Cooperativa consubstancia o princípio das portas abertas (CF, art. 5°, XVII e XVIII; art. 4°, I e art. 29 da Lei 5.764/71);

• um trabalho de educação cooperativista continuado aos associados que privilegie a diferenciação entre ato cooperativo e vínculo empregatício é fundamental, de forma a inibir desnecessárias demandas judiciais;
• É recomendável a subscrição de cotas-partes pelos associados, em valor e condições de integralização que permitam a presunção da adesão consciente.
• manter a ficha de matrícula, documentos anexos e dados cadastrais rigorosamente em ordem;

15.2 GESTÃO DEMOCRÁTICA

A gestão democrática da cooperativa na forma exigida pela Lei 5.764/71, consubstancia a condição de "dono" que o associado detém em relação a sua cooperativa

• promover a prestação de contas em AGO anual;
• convocar a Assembléia Geral nos termos da lei e promovendo a circulação dessa convocação mediante comunicados escritos que a cooperativa deve comprovadamente fazer chegar a todos os associados;
• buscar a participação otimizada dos associados nas assembléias gerais, mediante paralisação pelo menos parcial da prestação de serviços contratados no momento, em caso de eleição de diretores e conselheiros, abrir urnas para eleições nos locais de trabalho etc;

15.3 PROPORCIONALIDADE RAZOÁVEL ENTRE SERVIÇOS E REMUNERAÇÕES DOS ASSOCIADOS

A proporcionalidade razoável entre aquilo que o associado deixa para a cooperativa, a título de rateio de despesas (art. 80, § único, II, da Lei 5.764/71), comumente denominado de taxa de administração da cooperativa, e os serviços que a cooperativa presta ao seu associado, no oferecimento de infra-estrutura, aquisição de tecnologia, realização do marketing, administração dos contratos, negociação com os clientes, treinamento e qualificação profissional e estabelecimento de uma política de benefícios, assistência e seguros (PN SRF/CST 38/80), consubstancia o segundo elemento da dupla qualidade de associado: o de usuário da cooperativa (art. 4º, caput, e art. 7º da Lei 5.764/71);

• promover efetivamente o retorno das sobras líquidas do exercício ao associado.
• Não vincular honorários de assessores, consultores, administradores contratados, advogados ou contadores a percentuais e aos valores contratuais pactuados com os tomadores de serviços da cooperativa;
• Não contratar, por valores claramente acima dos praticados em mercado, os serviços prestados por terceiros à cooperativa, sobretudo em caso de comissão por captação de clientela

15.4 AUTONOMIA DIRETIVA, TÉCNICA E DISCIPLINAR DO ASSOCIADO, EM RELAÇÃO AO TOMADOR DOS SEUS SERVIÇOS

As dimensões diretiva, técnica e disciplinar (Instrução Normativa 03/97 e Portaria 925/95, ambos do Ministério do Trabalho) consubstanciam em seu conjunto a autonomia dos associados em relação ao seu tomador, contratante dos serviços com a cooperativa

• contratar com o tomador a vinculação a remuneração do serviço a resultados ou consecução de metas agregadas (não individuais), evitando se possível expor cláusula que adote o critério homem/hora para fixação do valor da remuneração
• evitar a interferência direta ou explícita do tomador na escolha ou seleção de associados a serem alocados para a prestação de serviços;
• fixar contratualmente as condições de execução dos serviços. Esta fixação pode ser feita pelos seguintes estágios:
- Requisição dos serviços : detalha os serviços objeto do contrato e suas condições para a prestação (técnicas, critérios, diretrizes, procedimentos e protocolos prescritos). Sua elaboração cabe à tomadora;
- Orçamento: É a resposta da Cooperativa à requisição dos serviços, de acordo com sua avaliação técnica da requisição. Define n° de associados alocados, as qualificações do pessoal, prazos e valores de contraprestação e condições de pagamento etc.. Está sujeito ao aceite do tomador;
- Proposta de Trabalho: Elaborado após o aceite do orçamento pelo tomador. É uma convenção, onde se firmará as condições de trabalho para os serviços objeto do Contrato (horários, escalonamento, processos, indica o líder e gestores da equipe e suas atribuições etc). De preferência, a convenção deve ser definida em reunião dos associados a serem alocados para a prestação dos serviços. Neste caso, a Proposta de Trabalho é assinada por toda a equipe presente na reunião, facultada a presença de um representante da tomadora, com direito a voz. Após, há o “de acordo” expresso do Contratante. Os associados que se incorporem posteriormente a equipe devem assinar um Termo de adesão à Proposta de Trabalho. As condições de trabalho devem ser ao menos anualmente revisadas pelos associados alocados na prestação dos serviços;

• A Cooperativa deve tomar para si, dotada de sistema gerencial interno compatível, cujos custos o contrato deve cobrir, as atividades diretivas, técnicas e disciplinares dos serviços contratados, cabendo ao tomador tão-somente o acompanhamento da prestação, para fins de verificação de sua realização conforme o contrato firmado e seus eventuais anexos;
• elaboração de normas de ética e disciplina e de processo administrativo interno da mesma para verificação da imputabilidade de condutas lesivas por parte do associado e a aplicação das sanções previstas;
• A troca de associados alocados na prestação de serviços deve obedecer aos procedimentos disciplinares previamente estabelecidos, preservado sempre o direito de ampla defesa do associado atingido.

15.5 IDENTIDADE ENTRE O OBJETO DO CONTRATO E O OBJETO SOCIETÁRIO

A conexão direta entre o objeto do contrato de prestação de serviços dos seus cooperados para o terceiro tomador e o objeto societário expresso nas normas estatutárias da cooperativa (art. 15, I e 21, I da Lei 5.764/71) consubstancia a atividade econômica de proveito comum entre os associados (art. 3° da Lei 5.764/71)

15.6 OBSERVÂNCIA DAS NORMAS DE SAÚDE E SEGURANÇA E HIGIENE NO TRABALHO

A cooperativa deverá garantir a observância das normas de saúde e segurança e higiene no trabalho, no que couber por analogia, o que consubstancia a conformidade da relação de trabalho cooperativa aos princípios gerais de proteção ao trabalho internacionalmente consagrados.

16 CONCLUSÃO

A Organização das Cooperativas Brasileiras entende estarem indicados neste documento requisitos mínimos para a existência de uma cooperativa de trabalho adequada. Com isso, pretende a OCB posicionar-se junto à sociedade divulgando e defendendo a cooperativa de trabalho viável.

A viabilidade de uma cooperativa de trabalho não pode estar fundada no sacrifício de direitos individuais do trabalhador, mas nas vantagens inerentes ao processo autogestionário.

Por outro lado, estes direitos não podem ser garantidos por uma aplicação das regras celetistas, próprias aos trabalhadores dependentes, eis que tais regras são incompatíveis com a autogestão. Existindo a autogestão, inexiste a subordinação trabalhista.

Autogestão e heterogestão são intrínsecos aos processos de prestação (elementos adjetivos) e extrínsecos à natureza (elementos substantivos) dos serviços laborativos ou profissionais prestados. Qualquer serviço contínuo pode ser prestado por forma heterogestionária ou autogestionária, vai depender da forma em que ele é prestado.

Qualquer prestação de serviços contínuos, para ser lícita ou ilícita, não depende de ser o contratado empresa ou cooperativa, mas depende da autonomia coletiva dos trabalhadores em relação ao tomador dos serviços. A cooperativa é o tipo jurídico típico da autogestão e a relação de trabalho estabelecida interna corporis nos moldes previstos pela Lei 5.764/71 (art. 90) não se configura empregatícia. Se preservada a autonomia coletiva dos trabalhadores cooperados em relação ao tomador, a prestação de serviços contínuos será lícita, ainda que não se verifique a existência de relação de emprego na prestação.